Welcome stranger! Hoje falaremos sobre a pérola dos games Indies, e não, não estou falando de Life is strange muito menos de Cuphead. Hoje vamos falar de um jogo que é muito importante para a sociedade gamer, empresas AAA, Indiedevs, e quem sabe, até para ser estudado em outros meios. Tudo pelo seu impacto e uso humano dos nossos problemas psicológicos, criando um game sem clichês trágicos e cômicos. Hellblade: Senua’s sacrifice trata de forma real e imersiva da psicose e fragilidade da mente humana de forma maestral.
Na nossa coluna Papo de gamer, esse humilde escritor falou um pouco mais dessa obra-prima da Ninja Theory. Partiu análise!
Uma aventura que é o oposto das jornadas vikings
Ambientado na cultura nórdica, no caminho para Helheim (terra dos mortos), Hellblade: Senua’s Sacrifice não é o game clássico onde os vikings definidos, valorosos, confiantes e de propósito bem definido são vistos. A protagonista Senua, nem é viking e sim uma vítima dos mesmos. A jovem é uma Celta que teve sua aldeia e seu amado mortos por invasões vikings. E após esse desastre na sua vida, ela irá atrás de redenção e resgate para a alma do seu amado Dillion.
História meio clichê? Sim, mas, acaba por aqui os clichês, a protagonista não é a heroína ideal, preparada física e psicologicamente para a jornada do herói, como vimos habitualmente no universo nerd (Cof! Cof! Mulher Maravilha), e sim, uma franzina e assustada jovem celta, portando somente uma espada e toda a dor e confusão do mundo em seus olhos.
Senua sofre de esquizofrenia e psicose, uma condição mental debilitante que afeta muitas pessoas no mundo real, e comumente é idealizada nas obras de ficção, como por exemplo, o maluco risonho e psicótico, o guerreiro solitário e sobrevivente, diversos modelos que expressam figuras fortes, confiantes e mesmo deslocadas da sociedade atual, conseguem ser imponentes e plenos à sua maneira, tudo isso é o oposto de nossa protagonista.
Ao olhar para a protagonista no início do jogo fiquei impressionado com a vida que percorria aqueles olhos, uma vida real, confusa, sofrida, determinada e solitária. Uma complexidade que poucos protagonistas de games puderam transmitir, uma sensação real, e tão real que é falha, frágil, mas determinada, tudo o que Senua terá de ser para concluir sua jornada que ao jogador durará em torno de 10 horas bem jogadas.
Com sua mente atormentada por vozes, que ela chama de “fúrias”, constantemente interagindo com ela, sendo algumas benéficas, encorajando e até avisando de inimigos à espreita, e a maior parte delas sendo maléficas, ofendendo, desestimulando a protagonista e por vezes, são confusas e com relatos incompreensíveis, mostrando uma confusão na separação do real e imaginário, que nos questiona constantemente o que é real ou não.
A construção de Senua foi o ápice do estúdio Ninja Theory, que mesmo criando diversos títulos AAA, sua obra-prima veio do trabalho de criar a protagonista, diversos especialistas da área da saúde e pacientes foram consultados para a criação, sendo um relato/construção muito bem feito. Além disso, a atriz iniciante Melina Juergens, foi magistral na sua interpretação e criação das expressões da personagem.
As batalhas mais duras são combatidas na mente
As vozes e a condição de incerteza no mundo de Senua são a maior dificuldade da sua jornada, sendo esse o foco e desafio do jogo, vencer sua fragilidade, medos, seguir em frente independente de tudo. A cada momento que Senua levanta e segue em frente mais esse jogador pensava na situação das pessoas em nosso mundo que convivem com essas condições.
Será recorrente os momentos em que a protagonista desabará em prantos, choro, e gritos desesperados, cada passo truncado que a protagonista dá, nos mostra uma nova vitória sobre seu maior inimigo, ela mesmo.
O inferno são os outros?
Os efeitos sonoros do jogo são o ponto forte da produção, foi onde a pequena equipe de treze membros mostrou todo seu potencial e experiência. Para jogar Hellblade, use os melhores fones de ouvido que conseguir, as vozes na cabeça de Senua estarão contigo também, com o sistema binaural eficiente, as vozes irão te fazer imergir e viver a confusão e solidão que aqueles macabros caminhos de Helheim podem incutir.
Além das fúrias dialogando em seus momentos de aventura, elas te alertam nos combates, avisando de inimigos furtivos e golpes traiçoeiros.
Gameplay
O jogo é ambientado em terras vikings, então esperamos muito sangue e machadada para todos os lados. E acontece, mas, nem de longe é o foco do game e o seu ponto forte. As batalhas são muito bonitas visualmente, com estilo de Dark Souls, sincronia e variação de movimentos na hora certa, comandos básicos com combinações nada inovadoras. Um modelo de combate que diverte, mas, se você focar nessa parte para se divertir com o jogo, irá se frustrar e entediar.
No final os combates ficam repetitivos juntamente com o modelo dos inimigos, salvo os momentos que as vozes interferem no combate, te alertando, apoiando e indicando (ou não) seu caminho.
Mesmo com batalhas repetitivas a beleza delas é surpreendente, os cenários, efeitos sonoros e visuais para as batalhas, efeitos de brilho e partículas, tudo feito com muita qualidade bem ambientadas. Acreditem, esse escritor teve um trabalho enorme para escolher as prints para a matéria.
A movimentação no cenário não é lisa e intuitiva, tirando o estereotipo do herói determinado que dá seus passos firmes em direção ao destino, Senua vive assolada na incerteza e ilusão, isso permeia seus passos truncados e imprecisos.
Podridão
Uma decisão de caráter da Ninja Theory e que é o caminho certo para esse game, uma jornada única. Em Hellblade a cada falha e morte de Senua em seu percurso a podridão que existe dentro da alma dela cresce, começando por seu braço direito. E cresce para fora, dominando o corpo e vontade dela. Se as falhas continuarem e dominarem ela, a missão acaba. Game over e seu save será deletado.
A famosa permadeath faz parte de Hellblade: Senua’s Sacrifice, ao morrer muitas vezes, seu save será deletado e acredite, mesmo se isso ocorrer você irá novamente se aventurar por Hellheim e pelo mundo de Senua.
A realidade é questionada constantemente na jornada de Senua, não somente em sua cabeça, mas, em todas as esferas, repetidas vezes o caminho apresentará puzzles e desafios de ilusão e perspectiva para progredir na aventura.
Um dos mecanismos utilizados é a procura de runas e símbolos nórdicos pelo ambiente para desbloquear cenários. As runas se encontram em perspectiva, em galhos, paredes e na paisagem recorrente do jogo. Desafio divertido, mas, que foi utilizado em excesso, o que tira um pouco o tesão desses desafios após algumas horas de jogo, mas nada que frustre e desanime a terminar esse game.
Veredito final
Hellblade: Senua’s Sacrifice é um jogo Indie que cumpre com seu objetivo com maestria, fazendo o que muitos estúdios tentam fazer, mostrar que o vídeo-game é arte e das boas!
É um game perfeito? Não, a gameplay tem seus deslizes, mas, afinal Senua não é perfeita, por que seu mundo seria?
Uma cópia do jogo nos foi cedida pela GOG para essa análise, garanta a sua cópia clicando aqui.