Análises

Análise: Super Mario Bros. Wonder é fenomenal nos mínimos detalhes

Eu consigo lembrar quase que nitidamente em meados de 2006 e 2007 quando vi a capa de “New Super Mario Bros.” pra Nintendo DS pela primeira vez. Na ocasião, eu estava acompanhado de um amigo, que não cansava de repetir que “é igual aos jogos antigos, mas está tudo novo” e ao olhar o Mario gigante na arte da capa, com um Mega Mushroom, dava pra sentir o gosto e a vontade de jogar as novas (porém familiares) fases e bizarrices.

Corta para alguns anos depois, em 2023, agora já na fase adulta. A arte da caixa de Super Mario Bros. Wonder volta a me chamar a atenção pelo mesmo detalhe: estampa as novidades, para demonstrar que será diferente em várias camadas. Diferente do Mega Mushroom, a Flor Fenomenal que é destaque da capa do novo jogo do bigodudo, aparece durante todo o jogo e é o completo foco de mecânica maluca, que dá forças a todo o novo visual que me fará gritar pra você nesta análise as mesmas coisas que meu amigo me falou anos atrás: é igual aos jogos antigos, mas está tudo novo.

A logo que aparece, logo no início do game.

Ser inovador depois de todos os jogos anteriores carregarem “New” no nome é um desafio tremendo, principalmente depois que a Nintendo lançou Super Mario Maker 1 e 2, basicamente permitindo que os usuários criem seus próprios desafios sem as amarras dos desenvolvedores. A única amarra que existe é irreplicável, a carta mais poderosa da Nintendo: conseguir sempre inovar a ponto de tornar o passado um belo legado, tão instigante a ponto de deixar tudo feito até então menos interessante, aumentando a empolgação para o futuro.

O fenomenal Super Mario Bros. Wonder me fez repensar o currículo da franquia Mario em 2D a ponto de achar injusto algo tão cheio de vida ter levado todo esse tempo para chegar. Pecando em pequenas lacunas mas acertando cirurgicamente em pontos gigantescos, este é o maior jogo de Mario plataforma 2D, mas não em tamanho, infelizmente.

Uma nova aventura pede um novo Reino

Reino Cogumelo? Nada disso. A aventura-maravilha de Mario e seus amigos acontece no Reino Flor, dito como ‘não tão distante’ do tão amado Reino da Princesa Peach. Após ver as Flores Tagarelas por tanto tempo como destaque em trailers e divulgações, foi mágico observar que elas possuem uma competente localização no nosso idioma, inclusive na dublagem. Era de se esperar que elas conduziriam a narrativa, certo? Nada disso (outra vez). Quem nos apoia com todo o contexto necessário é o Príncipe Florian, um simpático lagarto com o desejo de que seu Reino volte a ser pacífico, como era antes de Bowser aparecer e se fundir com o Castelo de lá ao interagir com uma Flor Fenomenal.

A realeza não se conforma com os planos de Bowser e consegue apoio de Mario e todos os seus amigos para que interrompam essa bagunça. Florian é capaz de dialogar com o jogador, expondo pontos de vista e sugestões que nos posicionam no mapa e definem nossos próximos passos. Além de todo o apoio textual, na coroa do príncipe ficam as insígnias, que alteram drasticamente a jogatina, trazendo alguns atributos que vão desde pequenas vantagens até novos comandos e atributos extras, como um nado mais coordenado ou um novo pulo ao cair em um abismo, por exemplo.

A jogabilidade que Mario 2D merece

As insígnias permitem estas e outras vantagens, além de tornar cada resolução de fase única, já que estas habilidades opcionais podem ou não estar equipados e, a depender do atributo, a jornada será completamente diferente. Gostaria de pular mais alto ou já começar alguma fase com algum item? Ou quem sabe ganhar mais moedas? Se desafie com a Insígnia da invisibilidade, onde o próprio jogador não se enxerga! Permita-se correr sem parar e até mesmo planar com seu chapéu. As possibilidades são muitas e elas não são mandatórias, fazendo com que o jogador possa ignorar completamente esse menu para uma jogatina mais tradicional, se assim o desejar.

Mudanças mais sutis aconteceram aos montes em Wonder, também. Ignorando a parte visual por enquanto (falarei sobre ela de maneira dedicada em outro momento), dá pra perceber que a tela de jogo está bem mais “limpa”. Isso por que nesse jogo não existe timer e nem pontuações, que ficaram no legado da série “New” por mero costume e honra aos clássicos. O fato de não haver um tempo para correr também abre portas para um “Modo Fácil” com os Yoshis e o Ledrão (Nabbit, antes da localização), pois estes não sofrem danos de inimigos, apenas de queda.

Mais acessível do que nunca, a única diferença entre personagens é de fato as vantagens do Modo Fácil, então aqui não tem personagens com atributos exclusivos, que flutuam ou pulam mais alto. Todas as diferenças de jogabilidade ficam a encargo das insígnias, que ressalto novamente, foram muito bem colocadas e introduzidas em forma de desafios, para familiarizar o jogador com os conceitos das mesmas antes de progredir com ela em seu inventário. Falando em personagens, vale ressaltar que este é o primeiro jogo 2D de Mario em que a Princesa Daisy é jogável e entra para a seleção, totalizando 12 opções para escolher, sendo 5 as já mencionadas com as vantagens do Modo Fácil.

Além de personagens diferentes, existem fases diferentes também! Existem curtos desafios até a linha de chegada, além dos já mencionados testes de insígnias, junto a pequenas caças ao tesouro e outras proposta mais curtas, deixando a jogabilidade mais interessante ainda, principalmente pensando na portabilidade e em jogatinas curtas e rápidas. Existe um evento Fenomenal para cada fase “comum” e todas elas tem colecionáveis, como as 3 “moedonas” que equivalem a 10 moedas roxas comuns (no lugar dos 3 medalhões de New Super Mario Bros. DS), além de todas as saídas secretas e todos os topos de bandeira. Uma fase só será dada como concluída se tudo for feito e descoberto (duh). A busca para o 100% exige atenção aos detalhes e um forte fator replay, ainda bem que o jogo exercita e incentiva isso da maneira certa!

O multiplayer mais individual em anos

É claro que jogar sozinho é um barato, em Modo Portátil então, prepare-se para babar. Mas existe muita diversão nos modos multiplayer, seja ele local ou online. Antes de aprofundar cada um de maneira separada, vale um recado que funciona para ambos: Super Mario Bros. Wonder foca em um multiplayer mais individual. Por mais contraditório que isso possa soar, a razão desta afirmação é pelo fato de que Wonder seguiu com a decisão de desabilitar o contato entre jogadores, impedindo você de esbarrar, usar seus amigos como plataforma ou joga-los no abismo (eu sei que você fazia isso, não estou aqui para te julgar). Já no online, todas as explicações sobre este modo usam o conceito de tudo estar acontecendo em “outra dimensão”, frisando e justificando a ausência de contatos. Então nada que acontece em uma jogatina afeta a outra, fica um conceito de tela sobre tela.

Apesar de mais isolados se comparados diretamente aos modos anteriores, no cooperativo local todos dividem a mesma tela, gerando tomadas de decisão bem divertidas, já que a coroa na cabeça de um personagem faz com que a tela siga o ritmo do coroado, apressando ou deixando os demais para trás.

Falando um pouco do multiplayer conectado, as únicas interações são a de poder salvar alguém que perdeu a vida e a de fincar estátuas na fase, servindo como uma base segura para outro jogador. Existem também os emojis/reações para agradecer e/ou expressar uma emoção rápida, nada muito complexo. A recompensa dessas contribuições é um contador de apoio, marcado por um símbolo de coração. Provavelmente por motivos de segurança, não existe chat por voz e não é possível criar salas privadas, então para jogar com seus amigos você só precisa de um sofá confortável, mesmo.

Ouvidos velhos vão ouvir músicas novas!

A fantástica música da fase 1-1 e consequentemente a música do trailer, que ecoa em variáveis para músicas de menu e etc. é extremamente cativante, mas, honestamente, a única que fica na cabeça. Claro, talvez com mais contato com o game e com mais tempo de mercado, estas tornem-se novos clássicos, mas pelo menos por agora, são ótimas trilhas mas não o suficiente para marcar fora das fases.

Com essa ressalva, o que encanta aos montes são os efeitos sonoros, que foram todos rearranjados: Sons de itens, de pulo, Salto bomba (a ‘cambalhota’), o final de fase, sons de dano e muitos outros. O som de pulo é uma nota musical, dando a impressão de que alguém interrompe uma performance constante para realizar o som do pulo “ao vivo”. Outros toques pensados nos mínimos detalhes são os efeitos ao pegar o potenciador de Elefante: todos os efeitos passam a ser baseados em barulhos mais “pesados”, instrumentados com um trombone, tanto das músicas quanto dos efeitos. Realmente uma performance de peso!

Sem muitos detalhes para que a surpresa seja sua, existem músicas performáticas que acontecem ao tocar em Flores Fenomenais de algumas fases. Essas sim, arrancam sorrisos, são memoráveis e incorporam a jogatina e os desafios. Um show a parte para todos os ouvidos e muito necessária e bem-vinda para a fórmula em duas dimensões do encanador.

Visual: o que encanta e faz jus ao adjetivo FENOMENAL

A riqueza de todos os detalhes que foram trazidos ao longo desta análise até então tem um denominador em comum: o visual apoia todas as tomadas de decisão. Sendo facilmente o Mario 2D mais carismático e expressivo de todos, inclusive superando os experientes jogos pixelados do encanador, o foco do time de desenvolvimento em expressões faciais, animações e fluidez foram a cereja do bolo que fizeram Super Mario Bros. Wonder ser o que é.

Repaginando tudo que conhecemos como visuais e fases, o jogo ainda se atentou a colocar a maior frota de novos inimigos que eu consigo me lembrar, talvez descontando Mario Odyssey da conta. A somatória dos mundos já serem vivos demais com a ainda mais intensa vida fornecida pelas Flores Fenomenais criam os mundos mais expressivos e gritantes que a franquia Mario 2D já teve o prazer de apresentar.

Com uma nova voz e novo visual, é possível dizer que tivemos praticamente um reboot de Mario e seus amigos e eu chego a ficar inconformado sobre quão capaz a Nintendo é em deixar tudo com um ar de familiaridade, como se sempre estivesse ali e fosse o normal há anos. A franquia deu novos passos que podem facilmente ditar os próximos anos de visuais de personagens e padrões de cenários para os próximos anos. O único ruim é que este excesso de unicidade trouxe consigo uma remessa menor de fases, mundos e desafios. É o preço a se pagar por uma experiência tão única, qualidade acima de quantidade pode assustar aqueles que queriam muitas e muitas horas de jogatina de plataforma.

Fora dos tópicos, mas como menção honrosa, seria lindo ver tudo isso em alta definição, não é mesmo? Saudades, rumores do Switch Pro em 4K, você seria bem-vindo aqui…

Conclusão

Nos últimos 15 anos houveram 3 jogos de Mario que me deixaram de queixo caído:

  • New Super Mario Bros. Wii, por permitir multiplayer de até 4 jogadores;
  • Super Mario Galaxy 2, por introduzir o Yoshi e a Throwback Galaxy (que remetia a Mario 64);
  • e finalmente, Super Mario Odyssey, por sua pegada mais realista e os poderes de Cappy.

O quarto dessa lista com certeza é Super Mario Bros. Wonder. Não há nada que Mario 2D fez até agora que encantou tanto e não há nada que Mario 3D tenha feito em níveis de inovação que Wonder não tenha correspondido. O pulo do Super Mario Bros. original para Mario Bros. 3 foi gigante e é possível comparar, nas devidas proporções, esse mesmo salto com Super Mario Bros. U e Wonder.

Reprodução: Nintendo.

O jogo é fantástico em tudo que se propõe, facilmente entrando como o jogo 2D de Mario mais querido e o melhor dos últimos tempos, conseguindo com folga um lugar aconchegante nos Top 3 jogos do Mario para muitos, incluindo a mim.

Dá para resumir o que brilha e o que poderia brilhar mais com o termo “pequenos detalhes”: se o jogo fosse um pouco maior, se houvessem mais potenciadores, mais temas cativantes e marcantes e mais criatividade nos chefes, ele seria perfeito. Mas também, por pensar em tantos pequenos detalhes que ele se consagrou como fenomenal, ao olhar com cuidado para as expressões, carisma visual, alterações de jogabilidade, novos personagens e inimigos, é como se tudo de negativo pudesse ser esquecido (leia-se passar o pano), apesar da falta sentida.

Aparentemente segurando criatividade para o futuro, Super Mario Bros. Wonder se mostrou competente em introduzir centenas de conceitos novos e também antigos, porém melhorados e revisitados. É o chacoalhão que a franquia 2D de Mario precisava desde 2009 quando chegou aos consoles de mesa e é assustador pensar que a franquia 2D caminhou (em passos lentos) por tantos anos na, agora limitada, forma da série “New”. É ótimo saber que Mario possui um coração tão vivo e expressivo e melhor ainda saber que será Mario Wonder quem irá bombear inovação e carisma para a franquia daqui em diante.