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Do NES ao Dread: a trajetória e importância do Metroid 2D

A E3 2021 aconteceu há pouco tempo e entre os principais anúncios por parte da Nintendo temos o que roubou a atenção de todos: Metroid Dread. O novo jogo da linha 2D da franquia será a primeira aventura inédita nesse aspecto em 19 anos. O trailer, para aqueles que não o assistiram, pode ser visto abaixo:

Se você não está tão familiarizado com Metroid 2D, o “Metroid 5” nos primeiros segundos do trailer pode ter te confundido um pouco. Afinal, Metroid Prime 4 nem saiu e já existe um Metroid 5?! Como é possível?

Eu explico: na verdade, a série Metroid pode ser divida em dois grandes polos: a franquia em 2D e a série Prime, que introduziu Samus ao universo 3D em 2002. Como a internet teve diversas reações ao anúncio de um Metroid 2D, vestirei minha camisa de fã da franquia para explicar um pouco mais sobre o histórico e relevância de Samus e suas aventuras em duas dimensões, passando desde o primeiro jogo, até a importância de seus remakes um a um, até chegarmos ao último lançamento, Metroid Dread.

Vamos revisitar toda linha do tempo dos Metroid 2D? Se você não os consumiu, relaxe: eu não vou abordar spoilers aqui, apenas contar a trama de maneira mais ampla, pincelando rapidamente o que cada um representou para a indústria e para a própria franquia. Vamos lá:

Metroid 1: Metroid (NES) – 1986

Pode não parecer, mas Samus é tão antiga quanto Mario e Zelda. Lançado em 1986 no Japão e posteriormente no resto do mundo, o Metroid original introduziu o que amaríamos ver e jogar nos anos seguintes. Toda a atmosfera solitária, a exploração intensa de um vasto cenário e inclusive os efeitos sonoros usados até hoje: tudo nasceu aqui, no NES e na década de 80.

Estar perdido em um cenário, sem saber o que o espera a cada porta nova, em uma constante busca por power ups que elevam a exploração e até mesmo o clássico inimigo Ridley: tudo isso foi trazido neste, que virou um clássico aclamado até os dias de hoje. Falando um pouco mais sobre o cenário, apesar de complexo e com muito a esconder, não havia um referencial visual, ou seja, sem mapas para te contar por onde foi e por onde deve ir. Desafiador!

Vale ressaltar que toda a história da franquia Prime, inclusive o ainda não lançado Metroid Prime 4, passa-se no intervalo entre o final do primeiro jogo e antes de Metroid II, ou Samus Returns, se contarmos o remake.

Metroid 2: Return of Samus (GB) – 1991

De longe o Metroid que mais sofreu tecnicamente, Return of Samus tinha duas tarefas dificílimas: contar uma história com o retorno de Samus e acompanhar o mais novo fenômeno da Nintendo na época, o Game Boy, respeitando suas limitações. A tela monocromática do portátil tornou a aventutra ainda mais limitada, mas essa foi a primeira demonstração de foco mais intenso exclusivamente nos Metroids, os abordando como algo mais complexo, já que Samus visita (leia-se explora) o Planeta SR388, lar da intrigante espécie.

O jogo seguiu a sadia tendência do mercado em explorar 2D divertidos que coubessem na palma da sua mão, e Metroid II faz exatamente isso, abordando uma outra visão para a franquia, que passou a caber no bolso.

Metroid 3: Super Metroid (SNES) – 1994

Se Metroid II sofreu com suas responsabilidades, Super Metroid superou todas as expectativas que foram depositadas. Dado o sucesso do SNES na época, Super Metroid foi a porta de entrada para muitos fãs da caçadora de recompensa. Com as possibilidades gráficas do Super Nintendo, Metroid foi além do que já havia entregado no passado, mostrando ainda mais carisma, personalidade e mostrando um imenso potencial para os anos seguintes.

A sensação de isolamento e solidão, o desespero e o entendimento de cenário em Super Metroid ficaram muito mais fortes e guiaram a franquia para um mundo 2D cada vez mais elaborado, com bastante espaço para contar mais histórias e até mesmo pensar em recontar o que já foi introduzido.

Falando um pouco sobre continuidade, este jogo conta em detalhes os acontecimentos dos jogos anteriores em seu início, mostrando aos jogadores que cada novo entrante da franquia possivelmente continuaria uma história interessante.

Esse clássico de 1994 ditou muitas direções para o futuro de diversos jogos e os mais saudosistas ousam dizer que inclusive trouxe personalidade o suficiente para ser o seu próprio gênero, já que estava a frente de tudo que a época produzia.

Metroid 4: Metroid Fusion (GBA) – 2002

Aqui está o melhor Metroid 2D, na humilde opinião deste que vos escreve. Metroid Fusion entendeu o impacto de uma narrativa detalhada e bem construída, inclusive assumidamente trazendo consigo o título de “Metroid 4” no início, relembrando aventuras passadas de Samus na introdução (assim como Super Metroid fez) e trazendo bastante diálogo e humanização para a trama, algo que vimos pela primeira vez por aqui.

Fusion trouxe a proposta de elevar a trama e realmente tocar o game como algo mais contínuo. Pela primeira vez, o jogo foge um pouco da proposta de “se vira aí”, já que o apoio pelo mapa é muito melhor e mais utilizado que em Super Metroid (diferente dos primeiros games, em Metroid 3 e 4 já podemos contar com um mapa!) e entre as explorações existem as Salas de Navegação, onde seu objetivo é realinhado e apontado no mapa. Fica mais fácil de se achar, mas não necessariamente impossível de se perder.

Essa obra prima do GBA traz um lado cheio de personalidade de Samus, abordando seus pensamentos e preocupações em uma estação solitária, o que cria bastante empatia do jogador sobre as tomadas de decisão da personagem e o que ela pode espera a seguir.

Como menção honrosa, vale mencionar que Metroid Fusion possui ligações de enredo com Metroid Other M, lançado para Nintendo Wii 8 anos depois de Fusion. O jogo se passa depois de Super Metroid e antes do que é contado em Fusion e até responde algumas perguntas sem resposta na trama de Fusion, mas por conta de suas apostas mais excêntricas em jogabilidade e abordagem, é sempre discutido se ele deve ou não ser contado na linha do tempo oficial da franquia.

[REMAKE] Metroid 1: Metroid Zero Mission (GBA) – 2004

Quase 20 anos depois, o primeiro Metroid é revisitado. Ganhando muito mais vida, novas habilidades e uma história mais profunda e entendendo o tamanho de Metroid após o sucesso de Super Metroid e a profundidade narrativa de Fusion, o remake Zero Mission teve como principal proposta atrair fãs de Metroid para onde tudo começou, sendo mais convidativo e agregando bastante para a história. O enredo deste jogo, assim como no primeiro, nos apresenta Samus e sua “missão Zero” de entrar no Planeta Zebes e deter os Space Pirates.

Nessa releitura do que foi proposto em 1986, temos conteúdos extras que não apareceram no original de NES e interligam o game ao restante da franquia. A mitologia é vastamente explorada, pois vemos mais sobre o passado de Samus e sua relação com os Chozo, além de existir um pós-game exclusivo dessa versão, onde controlamos a Zero Suit Samus em uma aventura mais furtiva, já que não contamos com a Power Suit dessa vez.

O remake não tira nada do original, ao contrário: apenas o incrementa e o eleva.

[REMAKE] Metroid 2: Metroid Samus Returns (3DS) – 2017

Samus Returns é um importante passo para Metroid. A proposta 2,5D (elementos renderizados em três dimensões mas em uma atmosfera 2D) funcionou muito bem e, se não assistir vídeos lado a lado com a versão de Game Boy, é quase impossível dizer que um é remake do outro. Estamos falando de 26 anos entre as duas versões, onde até a vastidão do que vemos do mapa na tela muda, por conta da diferença de resoluções. Coloque um Game Boy ao lado de um New 3DS XL e você entenderá o quanto a tecnologia andou de lá para cá!

O remake de 3DS traz novas entrantes para a franquia, como a mira livre e o Melee Counter, uma espécie de ataque físico para atordoar os inimigos e ter vantagem, mas tudo isso depende de um bom timing. A clara diferença entre versões também exigiu um redesign de tudo, e se você não for um saudosista, recomendo pular a versão de GB e ir para a de 3DS, tanto pela acessibilidade quanto pelos incrementos.

Assim como o remake de GBA para o primeiro Metroid (NES), o remake do segundo jogo aproveita para aprofundar mais a história e nos dar detalhes bem importantes para uma trama mais “redonda”, onde contamos com ganchos para jogos seguintes e as “memórias Chozo”, alguns frames de memórias que agregam bastante para toda a história, inclusive com dúvidas sem respostas em nenhum dos 4 jogos, sejam remakes ou não. Será que Dread nos responderá o que está em aberto?

Metroid 5: Metroid Dread (Switch) 2021

Falando nele, chegamos ao mais novo entrante que deu às caras na E3 de 2021. Metroid Dread pode ser um nome novo para alguns, mas saiba que trata-se de um projeto planejado para o Nintendo DS, com lançamento discutido para 2005 ou 2006.

15 anos de história, cancelado duas vezes e rumorizado infinitas vezes, Dread só está acontecendo graças ao apoio do estúdio MercurySteam, que co-produziu o remake de 3DS. Nesse tempo, as duas vezes em que o projeto foi cancelado foram causadas por limitações técnicas das épocas em que foi discutido. Viva os remakes, que possibilitam novos games! No caso de Metroid, eles ainda agregaram com conteúdos novos que possibilitam um hype muito maior para Metroid Dread.

Metroid Dread é a formalização de um carinho. Carinho dos desenvolvedores em alimentar um projeto por anos, que finalmente terá vida como eles gostariam (e até superando expectativas do passado, de acordo com o produtor da série, Yoshio Sakamoto) e carinho por parte dos jogadores, que sempre gostaram muito das aventuras em 2D e pensavam que talvez nunca mais fossem ver algo inédito.

A revista Game Informer listando Metroid Dread em 2005!

Sequência direta de Fusion, o que já foi divulgado pela Nintendo mostra uma perseguição entre Samus e a unidade robótica E.M.M.I., onde um encontro com a ameaça mecânica resultará em um Game Over direto. O trailer trouxe o foco em furtividade e anseio, características muito bem-vindas de serem revisitadas! Quem já precisou fugir de um Parasita X sabe do que estou falando: não é a toa que a palavra Dread traduzida significa “temor”!

Para aqueles que deixaram passar, um vídeo protagonizado por Sakamoto aprofunda alguns detalhes do desenvolvimento dessa sequência, que levou 19 anos para acontecer:

A importância do Metroid 2D

Você já ouviu falar no estilo de game Metroidvania? O nome (não oficial) foi carinhosamente dado para jogos do tipo 2D que se apoiam em forte exploração e entendimento de cenário, enquanto caminha, conhece e ganha experiência para acessar locais que antes eram impossíveis, pois o jogador não tinha habilidades para tal.

O nome vem de Metroid e Castlevania Symphony of the Night, de 1997, dois jogos com estilo 2D que funcionam perfeitamente em suas esferas e são uma eterna escola tanto para os desenvolvedores quanto para os jogadores. Pessoalmente falando, enxergo o mérito do gênero sendo exclusivo de Metroid. Para mim, Castlevania SotN entraria na categoria “soube usar bem a fórmula de Metroid”, mas é inegável que foi pioneiro em elevar a exploração de mapas interconectados para a faceta RPG. A briga de quem começou ou quem sobrepõe quem existe até hoje, fato é que ambos dividem o mérito e merecem isso. Mesmo Metroid acontecendo antes, SotN popularizou o gênero e mesmo SotN sendo fantástico, Metroid continua sendo único. E segue o jogo.

Aqui está o Metro… digo, Castlevania: Symphony of the Night

Os Metroidvania são incontáveis: se você gosta de Hollow Knight, Ori, Shantae, Dandara, Guacamelee e infinitos outros, você deve agradecer a Metroid (e a Castlevania, vai).

Um jogo 2D: sinônimo de indie?

A indústria de videogames evoluiu e apostou em diversas novas tecnologias, passando a amarga sensação de que “o 3D é a evolução do 2D” no processo, mas não é bem por aí. Similar a Mario e a Donkey Kong, o gênero está diretamente ligado a boas aventuras e nostalgia (afinal, foi assim que tudo começou, não é mesmo?), e é exatamente nisso que o Metroid 2D se baseia, com o plus de ter uma linha narrativa por trás, uma história a ser contada.

Por ser uma aposta mais forte entre os estúdios independentes (aqueles que fazem tudo sem o aporte e apoio de uma empresa gigante por detrás), muitos fazem a associação equivocada de que um jogo 2D é indie e por consequência deve valer menos no mercado, ou que algo nesses moldes é pouco caso de uma empresa grande como a Nintendo.

Para que fique claro aqui: indies não são necessariamente pixel-art e/ou jogos 2D e jogos 2D não são necessariamente independentes. Se assim o fosse, Super Mario Maker 2 (jogo Nintendo em 2D) seria um indie e Oceanhorn 2 (jogo indie 3D) não seria considerado independente, coisas que NÃO SÃO VERDADE. Então não, um gênero ou o tamanho de um estúdio não define o esforço e valor de um jogo e Metroid Dread não deve ser visto como um jogo indie.

Para concluir

Apesar de alguns ruídos, a notícia de que Dread está a caminho foi muito bem recebida por fãs e marinheiros de primeira viagem. Nessa E3, que mais pareceu ser um presente para os fãs mais antigos de tudo que a Nintendo representa, nos foi dito que muito do que vimos nos outros 4 Metroids será explicado e devidamente encerrado, mas que isso não significa o fim das aventuras de Samus em 2D, já que outra aventura parece já estar tomando forma.

A verdade é que um Metroid 2D inédito significa muito para a indústria, para os fãs, para os responsáveis pelo projeto e para quem vai se divertir e aprender com ele. Metroid 5 está a caminho e todos nós já queremos o 6, o 7 e assim por diante. Seja bem-vindo de volta, Metroid 2D!